domingo, 26 de agosto de 2007

Previsibilidade...

Quando a quantidade de certeza e o imaginável atinge a previsibilidade sórdida da convicção que tinha, tudo que poderá acontecer no futuro são meras derivações, onde deixa de existir o imprevisível absoluto e inevitável, onde a cegueira desfigurada desaparece e a fantasia utópica perde-se. Já tudo é susceptível e é isso que prevalece porque a raridade inaudita das acções de certas individualidades finou numa conclusão que há tempos já não é lícita. Mesmo assim subsistem pensamentos intraduzíveis que levam à obscuridade de sensações e a uma distracção da realidade corrente, que não consegue distinguir o talentoso do imbecil mas que esboça um sorriso autêntico, ausente de hipocrisias, de quem já antevia que as coisas terminassem desta forma, como sempre aconteceu e que prejudicam sempre alguém… quem será a próxima vítima?

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Esmola...

Não encontro as palavras exactas mas também não anseio cair nos mesmos erros porque continuo incompreendido, relutante, ingénuo e romanceio, fantasio acordado e divago por outros universos, em existências distantes à procura da balança, da ponderação, do equilíbrio que me harmonize as razões, as blasfémias do equívoco e a obstinação permanente. Contudo, apenas peço uma esmola, uma cura para esta solidão interna, alguém ou algo a que me possa agarrar, estabilizar e fugir destas intensas súplicas que me vão consumindo por dentro…

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Sedimentos...

As pegadas na areia, nos sedimentos que moldam as minhas impressões e afagam inexoravelmente o manto disperso de partículas espalhadas pela natureza e pelos mortais de forma deliberada ou involuntária… onde forçosamente, com a colaboração das vagas, do vento e dos rastos alheios, acabam por abafar os vestígios do rumo que tomei, do meu olhar sobre esse mundo e da minha visão sobre essa realidade. Agora persiste apenas na minha ilustre memória e para os restantes vai desvanecendo, aos poucos vai desaparecendo, morrendo lentamente porque já não encontra graça em si mesmo e já não representa um escravo do hábito…

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Conforto...

Fecho os olhos e vejo-me no local onde tudo terminou, sinto o cheiro da escuridão e num estado de coma impenetrável grito até ficar sem voz, afónico apenas ouço o meu eco, uma recordação ensurdecedora que saboreio com dissabor, talvez exagerado, provavelmente não! Agora sou livre e tento esquivar esse caminho, não ir por essa estrada tenebrosa à procura de cicatrizar os golpes que deixaste. Neste instante prefiro recordar tudo com um sorriso, amarelo e nem sempre autêntico mas com um esboço facial que simula a essência do contentamento com o qual gracejo a situação passada numa galhofa adornada mas que me conforta…

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Solidão...

A solidão, o exílio que também tem aspectos positivos, na qual permite uma reflexão, um distanciamento crítico ao nosso dia-a-dia, um momento de desígnio, de meditação e loucura. Um isolamento honesto num retiro momentâneo, rodeado do imaculado silêncio, de casto sossego onde longe de poeiras e terceiros amadureço as ideias, faço um juízo apropriado das opiniões e uma sentença adequada das atitudes. Estou num mundo que aparenta um deserto, onde tenho miragens, onde só enxergo um oásis imaginário e desidratado de fulgor mantenho-me neste casulo a sazonar até a metamorfose… e vou pagando o preço por ser nativo desta época cheia de liberdade, de autonomia e do nosso próprio egoísmo…

Não é a injustiça em si mesmo que nos fere, é o sermos vítimas dela…
(Pierre Nicole)

Dilúvio...

Que forma mais ingrata de começar as férias, nem sol, nem praia, nem mar, nem noite. Que dilúvio, que azáfama, enfiado em casa a remexer os meus demónios, a vaguear cerca dessa tormenta, desse esforço inglório onde ainda pressinto o odor a enxofre como se ainda estivesse entranhado no meu leito, no meu inferno. Procuro uma abstracção, uma forma de desfrutar este verão pantanoso mas nada ajuda, só encontro contrariedades, devo ter os deuses contra mim! Neptuno, Saturno, Minerva, Cupido, até Baco não tem aparecido em meu auxílio… mas que idiotice continuar a sacudir episódios que já deveriam estar esquecidos e sepultados, será falta de inteligência, falta de amor-próprio ou outro tipo de insatisfação relacionado com o desfecho ou com os factos ocorridos?

Ser inteligente é ser desconfiado, mesmo em relação a si próprio…
(Paul Léautaud)